domingo, 29 de agosto de 2010

Por onde andei.

Hoje é meu último domingo no Canadá. Terça-feira pela manhã to embarcando pra uma curtinha temporada de aventuras em NY. E mesmo depois de deixar o blog no limbo quase 2 meses é essencial vir aqui deixar algumas palavras.
Canada pra mim foi bom e ruim. Quero lembrar, e esquecer, pra sempre. Mas aprendi, e cresci, muito mais que eu esperava.
De milhões de possibilidades e expectativas, a viagem virou pesadelo. Conheci bruxas(landladies), fui atacada por monstros(bedbugs) mas também encontrei fadas madrinhas, e muitos, muitos companheiros de jornada.
Vi um Canadá que ninguém tem coragem de contar quando volta,- mas todo mundo vê e quer esquecer. Porque a gente só conta o que quer deixar na lembrança.

Vi e vivenciei muitos problemas numa Toronto que abriga cerca de 2,5 milhoes de pessoas.
Enquanto gastava horas tentando entender e capturar um pouco disso que eles chamam de sentimento (só) do eu. Fiquei indignada com o comodismo disfaçardo de pacifismo da população e o desrespeito deles com eles mesmos.
Cansei de reivindicar que alguém levantasse para um idoso ou grávida sentar no metrô. Falava mesmo, alto, pra ver se alguém tomava vergonha na cara. Mas algumas vezes funcionou.
Fiquei irritadíssima com o excesso de regras e proibições, mas também usufrui da sensação de segurança que isso trás. Vivi na pele a exploração da mão de obra informal e ilegal. E me senti uma mulher bem mais oprimida e coisificada do que jamais senti no Brasil.
Paguei 21% de imposto em cima de tudo. Paguei 22 dolares por mês a mais do que pagaria morando em NY para andar num transporte público que tem 2 linhas de metrô, quebra todos os dias e fecha às 1:30h da manhã(fatos verídicos).
Escutei bem mais Coreano, Japonês, Mandarim(China), Espanhol, Hindu(India), Urdu(Arábia Saudita), Italiano, Português(de Portugal e do Brasil), mas bem mais mesmo do que gostaria e ainda pior, bem mais que Inglês.

Fique pasmo/a, mas mais de 100 línguas são faladas cotidianamente em Toronto.
66% da população canadenses é de recém-imigrados. Mais de 50% não nasceram no Canadá. 59% são idosos e mais de 42% são o que eles chamam de vísivel minoria(não me pergunte o que, diante desse quadro, é minoria pra eles). *Dados: City of Toronto.
Se assumirmos que um "autêntico canadense" seria alguém cujo seus antescendes de 2º grau nasceram no Canadá(no caso, seus avós), eu digo para você que em 6 meses aqui eu não conheci ninguém, eu disse nínguem que é "canadense de verdade" e não foi por falta de otimismo ou curiosidade.
Não encontrei uma fonte registrada para afirmar isso, mas é de conhecimento comum aqui que mais de 60% da população é de asiáticos. Pelo olhometro, o achometro seria ainda mais um pouquinho, os olhinhos puxados dominam e sustentam a economia desse país.
Por quê? A história é bem antiga, desde as primeiras linhas de trem- os canadenses costumam dizer que para milha de linha ferrea nesse país, pelo menos um chinês morreu. Sim, eles trouxeram chineses para trabalhar praticamente de graça e para ascender explosivos sem fio de longa distancia, eles colocavam chineses pra explodir junto com as dinamites que abriam os tuneis e montanhas. Na segunda guerra, os japoneses que viviam aqui há décadas foram colocados em algo como campos de concentração e todos os seus bens foram capturados pelo governo. Depois que a guerra acabou, deram uma passagem de ida pra Japão, ordenando eles voltarem pro país que nunca foram.
Nos dias atuais, eles não precisam de visa pra vir e sustentam o setor de serviço informal, junto com os indianos. Já os brasileiros, portugueses e outros latinos, são a mão de obra da construção civil.

A impressão que eu tenho daqui é que todo mundo que quer ficar ou é ilegal, ou tá "aplicando" ou é "récem-aplicado". Longe de mim dizer se isso é bom ou ruim. Mas é de se ressaltar que nesse lugar, com tantas regras e leis. No ponto imigração e trabalho, todos fazem vista grossa enquanto a galera trabalha de 12 a 14 horas por dia.(e viva a mais valia)

Passei 5 meses aqui, e aprendi uma história além de iglus, neve e carpinteiros.
Passei 5 meses aqui, e descobri que a única comida típica do Canadá é o Poutine, batata-frita com queijo mussarela derretido em cima e um molho de tomate. Aprendi que dia 24 de maio é dia da Victoria(a rainha da Inglaterra) mas nínguem se importa o por quê. Aprendi que quem é de Okinawa fala uma língua e tem um cultura completamente diferente que o Japão. Que ambos(Koreia e Japão) tem certa rejeição a China. E que Soju é a bebida típica da Korea.

Aprendi mais um monte de coisa, mas principalmente aprendi sobre muitas culturas e como é mágico quando você ultrapassa a barreira do diferente, do preconceito e da rejeição e se vê apaixonada em conhecer outras culturas. Transformar e ser transformado pela cultura do outro. Sorrir, honrar e abraçar cada um do seu jeito. Vi uma coreana, nossa primeira roomate, quase morrer quando Fabi foi abraçar ela no dia do seu aniversário em Maio. E hoje, Jon Yun me deu beijo na bochecha e chorou no abraço de despedida. Me vi curvando para meus amigos coreanos quando nos despediamos, como um ato de respeito e de agradecimento pelos bons momentos em que passamos juntos.
Conheci a Aoi, uma japonesa doce e carinhosa que surprendeu pelo seu calor humano.

Não imaginei que ia ficar triste de sair daqui, mas to derramando lágrimas desde que começei a escrever esse texto. É impossível esquecer todos os momentos de desespero que passei aqui, mas é inaceitável dizer que foi apenas isso. É hora de começar a viagem de volta. E em tempo de ir, levo um coração carregado de saudade.